“Nada mais profana tanto Mamom [o deus dinheiro] do que ser dado, doado, ofertado, de coração, com alegria, sem nada esperar em troca”, Augustus Nicodemus.
Convidamos autores e líderes da igreja evangélica brasileira para uma série intitulada “retorno ao básico”, com o objetivo de abordar temas centrais da fé cristã, como um convite a retomar as práticas espirituais que sustentam, direcionam e edificam. Por meio dos artigos da série, queremos chamar a atenção do leitor para o é basilar e dá vigor à caminhada, alimenta a espiritualidade e aproxima de Deus, ao que é e deve ser simples.
No artigo a seguir, Augustus Nicodemus, pastor, escritor e professor, traz reflexões sobre a relação que o cristão deve ter com o dinheiro e trata da questão dos dízimos e das ofertas. Um conteúdo esclarecedor. Tome nota e retornemos ao básico!
O Deus Mamom
“Ninguém pode servir a dois senhores, pois odiará um e amará o outro; será dedicado a um e desprezará o outro. Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro [Mamom]” (Mateus 6.24, NVT).
Uma pesquisa no Novo Testamento revelará que Jesus falou acerca do dinheiro com mais frequência do que muitos outros assuntos – à exceção do reino de Deus. Acredito que a razão para isso é que o dinheiro é uma realidade humana que pode abençoar ou amaldiçoar as pessoas poderosamente. O mundo usa o dinheiro para intimidar, ameaçar, corromper e aliciar as pessoas, para comprar prestígio e honra.
Além disso, vivemos numa sociedade psicótica, dirigida por uma extravagância compulsiva, uma mania por mais, mais e mais. Corremos o risco de deixar que o dinheiro domine nossa vida e a vida da Igreja. O autor Thomas Merton escreveu, “Na sociedade moderna, o dinheiro usurpou diabolicamente o papel do Espírito Santo na Igreja”. Por essas razões e outras é que o Senhor falou tanto sobre dinheiro e poder.
Uma das passagens dos Evangelhos em que o Senhor Jesus tratou do dinheiro e poder é Mateus 6.24: “Ninguém pode servir a dois senhores, pois odiará um e amará o outro; será dedicado a um e desprezará o outro. Vocês não podem servir a Deus e ao dinheiro”. Destaquemos alguns pontos sobre o dinheiro e poder que podem ser extraídos dessa passagem e de outras do Novo Testamento.
1. O dinheiro em si não é algo totalmente neutro
Geralmente se pensa que o dinheiro é simplesmente um meio neutro de intercâmbio que pode ser manuseado sem problemas. Porém, pelas palavras do Senhor Jesus acima, podemos perceber que o dinheiro é uma espécie de poder que procura dominar e conquistar os que o manuseiam.
Primeiro, Jesus classificou as riquezas como sendo um “senhor”, ao dizer que ninguém pode servir a dois senhores, ou servem a Deus ou às riquezas. Segundo, Jesus se refere ao dinheiro como sendo “mamom”. Esta palavra foi traduzida como “dinheiro” (NVT) ou “riquezas” (RA), mas perdeu-se o seu significado mais profundo: é uma palavra aramaica usada para o deus sírio das riquezas e do dinheiro. Jesus colocou “mamom” em oposição a Deus, como se fosse um deus rival. Não é de estranhar que Paulo considera a avareza (amor ao dinheiro) como sendo idolatria (Cl 3.5).
Esta é a única maneira de entender por que Jesus sempre tratou o dinheiro de forma radical, mesmo aqueles bens adquiridos de forma lícita. Por exemplo, ele exigiu que o moço rico se libertasse do domínio e do poder daquele “deus rival” (Lc 18.18-30). Ele só proclamou a salvação de Zaqueu quando viu que ele havia se libertado do domínio do dinheiro — quando Zaqueu, que era chefe dos cobradores de impostos, prometeu dá-lo aos pobres e restituir o roubado. Conforme Lutero disse, são necessárias três conversões: do coração, da mente e da bolsa. Notemos ainda o ensino do Senhor sobre isso:
- “Que aflição espera vocês, ricos […]” (Lc 6.24)
- “Não ajuntem tesouros aqui na terra” (Mt 6.19)
- “É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha que um rico entrar no reino de Deus” (Mt 19.24)
- “Vendam seus bens e deem aos necessitados” (Lc 12.33)
- “Dê a quem pedir” (Lc 6.30)
- “Ninguém pode se tornar meu discípulo sem abrir mão de tudo que possui” (Lc 14.33).
- “Morreu também o rico, e foi sepultado. E no inferno, ergueu os olhos, estando em tormentos…” (Lc 16.22-23, ACF).
As advertências do Senhor quanto às riquezas e suas demandas radicais aos que as possuíam apenas confirmam nosso ponto: o dinheiro não é algo tão neutro assim, ele traz potencialmente em si o poder de nos dominar e conquistar.
Conheça: O que a Bíblia fala sobre dinheiro, livro escrito por Augustus Nicodemus
2. Não devemos permitir que o dinheiro nos domine
Como uma potestade, o dinheiro está sempre procurando que o sirvamos. Lembremos que uma das tentações de Satanás no deserto foi oferecer a Cristo todas as riquezas do mundo (Mt 4.8-9). Por detrás do dinheiro estão poderes espirituais sedutores, que exigem nossa devoção integral. Infelizmente, não são poucos os que têm caído e se submetido ao deus dinheiro. Vejamos algumas características de quem está escravizado por Mamom:
- Busca desenfreada e compulsiva por ter mais e mais. Há pessoas que assumem vários empregos, não porque realmente precisam, mas porque querem mais dinheiro, querem subir cada vez mais alto na escala social. E às vezes, são capazes de usar de meios ilícitos para obter o que querem.
- Tentativa de controlar e manipular as pessoas através do dinheiro.
- Tratamento diferenciado para com os que têm e os que não têm dinheiro. Talvez por isso todos querem saber quanto os outros ganham, para saber como devem tratá-los ou para saber se eles são importantes o suficiente para lhes merecer a atenção.
- Falta de espírito liberal de dar. Certa feita, João Wesley declarou, “Se você deseja escapar da condenação do inferno, dê tudo o que puder. Caso contrário, não posso ter mais esperança em sua salvação do que na de Judas Iscariotes”. Lembremos que uma das características da Igreja Cristã apostólica, em Jerusalém, cheia do Espírito, foi dar o que podiam para atender as necessidades dos outros (cf. At 4.32-37).
- Decisões ditadas exclusivamente pelo dinheiro, e não pelo desejo de realizar a vontade de Deus. As decisões são tomadas basicamente levando-se em conta as questões e os aspectos financeiros envolvidos, e a busca da vontade de Deus sobre aquele assunto acaba ficando de lado. As pessoas fazem as coisas porque desejam sair ganhando em algo, e não porque desejam realmente fazer o que é correto e agrada a Deus.
- Apego ao dinheiro, com a consequente dor em separar-se dele. Quem é servo de Mamom sofre intensamente diante da perspectiva de dar, doar e contribuir, pois significa separar-se da entidade a que serve.
3. Devemos usar o dinheiro, e não sermos usados por ele
Mesmo sendo uma potestade, o dinheiro pode ser vencido e colocado a serviço de Deus e seu reino. Muito embora a frase seja difícil de entender, o Senhor Jesus certa feita disse: “usem a riqueza deste mundo para fazer amigos” (Lc 16.9), com isso dizendo que Mamom pode ser domesticado e usado para as coisas certas.
O próprio Senhor se valeu do dinheiro muitas vezes, durante seu ministério. Ele permitiu que mulheres ricas o servissem (Lc 8.1-3), comeu com os ricos e poderosos (Lc 11.36; 14.1), participou das bodas de Caná da Galileia (Jo 2.1), aceitou ser ungido com extravagância duas vezes, e foi sepultado no sepulcro de um homem rico. Da mesma forma, quantos benefícios a Igreja tem realizado no mundo através do dinheiro, com missões, escolas, hospitais, universidades, alimentação, moradias, educação e obras sociais em geral!
Como, porém, conquistar a potestade Mamom e usá-la para a glória de Deus? Há várias sugestões que gostaria de fazer: estudar a Bíblia sobre esse assunto, conhecer melhor a necessidade material e espiritual das pessoas ao seu redor, tomar todas as decisões que envolvam dinheiro com muita oração, valorizar as pessoas mais que o dinheiro, eliminar todo favoritismo que tem base nas posses das pessoas, tomar a decisão de gastar menos, economizar mais.
Mas há uma coisa, acima de todas as outras, que representa o próprio destronamento de Mamom em sua vida: dar. Nada mais profana tanto o deus dinheiro do que ser dado, doado, ofertado, de coração, com alegria, sem nada esperar em troca. Quem dá de coração livre experimenta uma grande liberdade do poder do dinheiro em sua vida e está dando o passo mais importante para conquistar o deus Mamom e fazê-lo servo do Altíssimo.
Contribua. Dê regularmente seu dízimo para o sustento da obra de Deus através da Igreja. Dizimistas regulares recebem de volta muito mais do que dão, em alegria, liberdade e gratidão a Deus.
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