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Igreja e engajamento social: fé e política se misturam?

Para falar sobre o assunto, conversamos com Antônio Carlos Costa, fundador da ONG Rio de Paz. Confira a primeira parte da entrevista exclusiva

Se você tem vontade de se envolver com ações voltadas à filantropia e à ajuda humanitária; se anseia por ser um cidadão engajado e um cristão mais comprometido com as causas urgentes que acometem o nosso país, mas não sabe por onde começar, esta entrevista pode ajudá-lo!

Com o intuito de muni-lo com informação relevante relacionada à ação da igreja e a busca de melhores condições de vida e justiça social, conversamos com Antônio Carlos Costa, teólogo, pastor, jornalista e autor de Convulsão Protestante – Quando a teologia foge do templo e abraça a rua.

Expressão conhecida no Brasil e no exterior por sua militância a favor de comunidades pobres e vítimas da violência, Antônio é também fundador e presidente da ONG Rio de Paz, instituição engajada na redução das violações dos direitos humanos.

Nesta primeira parte da entrevista, o autor fala sobre os principais problemas que impedem o avanço da igreja brasileira no que diz respeito ao socorro aos necessitados e compartilha sua opinião sobre fé e política. Acompanhe!

Mundo Cristão: Em sua opinião, a igreja brasileira tem se engajado satisfatoriamente em ações de transformação social, defesa dos direitos humanos e atendimento aos mais necessitados?

Antônio Carlos Costa: Creio que estamos muito aquém do que a Bíblia pede que façamos e do que poderíamos fazer, especialmente pelo fato de estarmos inseridos em uma democracia e tendo em consideração o próprio tamanho e dimensão da igreja brasileira.

É sintomático ver que não temos personalidades públicas no meio evangélico, pessoas que exerçam influência nos meios de comunicação, entre os formadores de opinião e a elite intelectual do país. Do ponto de vista de sua ação política, por exemplo, a igreja poderia ter sido protagonista de obras de transformação histórica em dias em que o país passou por grandes manifestações nas ruas, como em 2011 e 2013.

Eu acredito que isso se deve ao tipo de teologia que está na cabeça de alguns pastores, o que, consequentemente, reverbera entre os fiéis.

E qual seria esse tipo de teologia que impacta negativamente o engajamento social por parte da igreja brasileira?

A que é fundamentada em aplicações indevidas da verdadeira doutrina. Existem pessoas que acreditam que não há muito o que fazer para melhorar a condição de nossa sociedade, uma vez que a esperança final do planeta está na parusia, ou seja, na segunda vinda de Cristo, na ação soberana de Deus criando novos céus e nova terra.

Tal postura é uma contradição, pois a Bíblia diz que podemos ser sal da terra e luz do mundo. A Palavra nos dá a esperança de que, mediante a atuação da igreja, este mundo pode deixar de ser tão mau. Outra aplicação indevida das Escrituras tem a ver com a limitação da ação da igreja apenas à evangelização, sem levar em conta o socorro ao necessitado. 

Anunciar as boas novas, obviamente, é nossa missão número um, mas não podemos nos esquecer de que, ao lado da Grande Comissão, temos o grande mandamento (Mt 22.36-40). Se somos chamados a evangelizar, somos também chamados a amar. O amor nos leva a fazer mais do que pregar o Evangelho para o perdido, especialmente quando o encontramos com fome ou sofrendo violação dos Direitos Humanos.

Além desses, outro problema que acomete a igreja brasileira é a leitura dos textos bíblicos muito condicionada pela produção literária de parte do protestantismo norte-americano, de quem os pastores brasileiros dependem muito no que diz respeito à formação teológica. 

De que forma líderes e denominações podem viabilizar mecanismos de ajuda humanitária e desenvolvimento social?

Não há nada mais importante do que a pregação do Evangelho, porque faz com que o homem conheça todo o conselho de Deus e os desdobramentos da Palavra nas diferentes áreas da vida humana. O trabalho de púlpito é insuperável. É fundamental que o pastor faça contato com os pobres, visite as favelas, os bairros de periferia, os hospitais e as escolas públicas de sua cidade para ter uma ideia do que está acontecendo.

Além disso, é necessário buscar informação, seja nas universidades, nos jornais ou por meio de conversas com lideranças de movimentos sociais. O pastor não deve politizar o púlpito e usar o momento de culto para mandar recado para o presidente da república, para o governador ou para o prefeito, pois isso é inócuo.

Por outro lado, creio que o pastor deve exercer a sua cidadania. Quer dizer, lutar por seus direitos e pelos direitos de todos. Da mesma forma, creio que os membros das igrejas deveriam se sentir vivos para formar associações voluntárias, ONGs e instituições diversas, até mesmo se filiar a partidos políticos e se candidatar para agir na esfera pública.

Muitas pessoas dizem que igreja e política não se misturam, alegando a necessidade de um distanciamento entre ambos. Isso de fato tem de ser assim?

É impossível viver na polis e não estar envolvido direta ou indiretamente com a política. Temos documento de identidade, CPF e pagamos impostos. Somos cidadãos e sócios da República Federativa do Brasil. Há afirmações do Evangelho que são profundamente políticas.

A Bíblia, por exemplo, pede que nos submetamos às autoridades e que oremos pela paz da cidade (Jr 29.7; Lc 20.25; 1Tm 2.1-4). Isso é político. O amor cristão nos leva a lutar politicamente quando a solução dos problemas humanos é de natureza política.

Agora, uma coisa é declarar que o Evangelho tem implicações políticas; outra coisa é deixar que sua mensagem seja cooptada por ideologias de esquerda ou de direita, seja o marxismo ou o neoliberalismo. Cristianismo não cabe nem em um extremo nem em outro.

E como manter-se em equilíbrio, evitando os extremos?

Por meio do conhecimento da própria natureza, essência, glória e dimensão do Evangelho. É impossível que uma mensagem tão abrangente como essa, relacionada ao ser e aos atributos de Deus, que elucida suas intenções para a história, caiba dentro de uma ideologia política.

Quando temos tal conhecimento, nos recusamos a colocar a Palavra em uma camisa de força e à serviço de uma ideologia humana. É preciso ter uma mentalidade profundamente dialética, que enxergue os dois lados de uma mesma moeda.

Historicamente, sempre que se deixou cooptar pelo palácio, pelo contexto cultural ou filosófico que envolvia a sociedade em determinado período, a igreja perdeu seu senso e sua autoridade profética. 

Fique por dentro!

Na segunda parte da entrevista especial sobre Igreja e engajamento social, Antônio Carlos Costafala sobre as dores e as alegrias da ação humanitária e dá dicas preciosas para quem deseja colocar a mão na massa e fazer a diferença. Não perca!

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