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Antônio Carlos Costa em artigo para o site Uol

Sociedade desigual sempre cumprirá o papel de parteira da maldade

Confira o artigo escrito por Antônio Carlos Costa, autor de Convulsão Protestante, para o portal Uol 

Sempre que tomamos conhecimento do envolvimento de um pobre numa prática criminosa, nos dividimos em dois grupos opostos: primeiro, o daqueles que põem toda a ênfase na responsabilidade pessoal do criminoso.

Bradamos: “Não há o que justifique o crime”. Num outro extremo, há os que eliminam a responsabilidade humana ao botarem todo o peso da responsabilidade sobre o caráter corruptor do meio, a injustiça social.  

Ambas as formas de pensar são desumanas, irracionais e carentes de simetria.

Elas cometem o erro de elevar um aspecto da verdade à condição de verdade completa.  Negar a responsabilidade humana é conduzir a sociedade ao caos.

Significa atribuir ao comportamento humano um determinismo – de natureza social – que lança no lixo todo o conceito de dignidade do ser humano.

O que também nos conduz a declarar o que ninguém consegue sustentar na prática, especialmente, quando se põe no lugar da vítima. 

Não considerar o papel corruptor do meio – o poder corrosivo da desigualdade social –, é praticar, de modo diferente, os mesmos erros supramencionadas. Expõe a sociedade ao caos, uma vez que nega as causas indiscutíveis de grande parte dos conflitos entre homens. Por que adolescentes suecos, finlandeses e noruegueses não estão praticando roubo com faca?  


“Não quero viver num país que exponha a vida de seus cidadãos aos motivos torpes de criminosos contumazes, mas também não quero viver num país cuja a consciência esteja tão cauterizada a ponto de se esquecer dos seus milhões de miseráveis.”


Pensar apenas no dever do indivíduo, sem considerar suas circunstâncias político-sociais, nos expõe a pensamento racista presente na cabeça de muitos: que todos estamos sujeitos a um outro tipo de determinismo, o que atua do modo mais inexorável possível: o genético.

Matamos muito no Brasil porque somos uma sub-raça mestiça; como se a violência não fizesse parte da história de nações, consideradas por nós civilizadas, que têm no seu currículo coisas do tipo “Noite de São Bartolomeu”, “Guerra do Vietnã”, “Gulags”, “Colonização da África”, “Guerra do Ópio”.   

Podemos ser contra a impunidade e ao mesmo tempo protestarmos contra as causas sociais da violência. Salta aos olhos um fato. Não sei como não o consideramos.

Uma sociedade desigual, na qual os desiguais vivem lado a lado, regida por uma cultura de consumo, num contexto de guerra às drogas e Estado fraco, cujas instituições não funcionam como deveriam, sempre cumprirá o papel de parteira da maldade. 

O mal que se encontra presente em todos nós, seres viciados em nós mesmos, não se manifestaria, em grande parte, se não fosse provocado.

É certo que esse modelo de sociedade não levará a todos à prática do crime, mas sempre levará alguns, o que não elimina a responsabilidade pessoal do criminoso, mas avulta a responsabilidade social dos que permitem a si mesmos viver em sociedades caracterizadas pela presença de guetos de exclusão. 

No Brasil, historicamente, sempre combatemos a violência com violência. Nossa história é uma história de genocídio, desigualdade e abuso de poder.

É estranho, vivendo num país como esse, falarmos mais sobre punição do que sobre inclusão.  Não quero viver num país que exponha a vida de seus cidadãos aos motivos torpes de criminosos contumazes, mas também não quero viver num país cuja a consciência esteja tão cauterizada a ponto de se esquecer dos seus milhões de miseráveis. 

Fonte: Uol

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