Confira nossa conversa com a autora de “A menina da foto” e inspire-se com seu emocionante testemunho de vida
No mês de setembro, a Editora Mundo Cristão lança uma obra célebre: A menina da foto – Minhas memórias: Do horror da guerra ao caminho da paz, autobiografia escrita por Kim Phuc Phan Thi, figura que ficou mundialmente conhecida por protagonizar a icônica imagem registrada por Nick Ut, fotógrafo da Associated Press, durante a Guerra do Vietnã, em 8 de junho de 1972. Na foto, Kim Phuc, aos nove anos de idade, queimada após um ataque a bomba, corre sem roupas em meio a crianças e soldados.
O registro, inquietante e comovente, rendeu a Nick Ut o prêmio Pulitzer em 1973 por Fotografia de Última Hora (atualmente chamado de Reportagem Fotográfica). Hoje, Kim Phuc é embaixadora da Boa Vontade pela Unesco e promove a paz e a fraternidade ao redor do globo.
Durante sua visita ao Brasil, Kim Phuc conversou com a equipe da MC. Em entrevista, a autora fala sobre sua história de vida, toca em assuntos como guerra, paz, política e liberdade e compartilha um eloquente testemunho de restauração por meio da fé em Jesus Cristo.
Ao final do bate-papo, Kim também dá alguns insights acerca do que os leitores podem esperar de seu livro e deixa uma mensagem a quem está enfrentando dificuldades. Um conteúdo imperdível. Confira!
Mundo Cristão: Kim, o que você sente ao saber que sua autobiografia está sendo lançada no Brasil e que ela tem o potencial de alcançar leitores não somente aqui, mas, também, em outros países de língua portuguesa?
Kim Phuc: Eu me sinto muito animada com isso. Estou emocionada e feliz com o lançamento de meu livro em português. Eu estava esperando ansiosamente por esse momento.
Qual mensagem você pretende transmitir por meio de seu testemunho de vida? Qual semente deseja plantar no coração dos leitores?
Eu quero que os leitores saibam o que aconteceu comigo e que, apesar de tudo que vivi, eu encontrei a paz. Meu sonho é que cada leitor encontre essa mesma paz.
A foto. O que você pensou quando viu sua famosa fotografia pela primeira vez? E, hoje, depois de tantos anos, o que vem à sua mente quando você vê aquela imagem?
Vi a foto pela primeira vez ao voltar para casa, depois de quatorze meses de internação. Na ocasião, meu pai a recortou de um jornal vietnamita e a mostrou para mim. Quando vi a imagem, eu me senti muito feia e envergonhada, porque eu era uma pequena garota nua e em agonia. A sensação foi horrível em um primeiro momento. Eu pensava: “Essa imagem é tão feia. Por que o foco da câmera ficou em mim? Eu não gosto dela!”
Dez anos depois, quando a Guerra do Vietnã já havia acabado, muitos jornalistas foram ao país para celebrar o aniversário da minha foto. Foi aí que tive a oportunidade de assistir à filmagem que fizeram no momento em que fui queimada pela bomba de napalm.
Quando eu vi as imagens, especialmente as de minha avó carregando meu priminho extremamente queimado, e eu, criança, correndo pela estrada, percebi que a minha fotografia tinha uma grande importância, ela causava impacto ao redor do mundo. Passei, então, a sentir-me mais atraída por ela.
A grande mudança na forma como eu enxergava minha imagem em meio à guerra, no entanto, aconteceu quando eu me tornei mãe, muitos anos depois, quando já morava no Canadá. Ao carregar meu filho, Thomas, no colo, eu pensava: “Como podem deixar acontecer situações como a guerra no mundo! Como mãe, farei de tudo para que meu filho jamais sofra como aquela garotinha desesperada da foto. Lutarei não só para que meu filho tenha segurança, mas para que todas as crianças ao redor do mundo também possam tê-la”.
Foi nesse momento que me tornei extremamente agradecida pela fotografia. Aquele registro se tornou um grande presente de Deus, um presente poderoso! Hoje, eu olho para a foto e digo: “Não mais guerra!” Assim, por meio dela, busco formas de promover a paz.
Guerra. O que essa palavra significa para você?
Eu não acredito na guerra! A guerra é uma realidade horrível, é sofrimento, dor, perda e falta de esperança. A guerra é tudo de negativo.
E paz?
A paz é tão bonita e maravilhosa. Eu acredito que todas as pessoas merecem viver tudo o que essa palavra significa. Não importa a origem, a cor ou a situação financeira, seja quem for, creio que todo ser humano merece vivenciar a paz. Quando eu era apenas uma garota, eu aprendi tanto a respeito da guerra e do sofrimento. Mas, hoje, a situação mudou.
Eu encontrei paz em Deus. Ele curou meu coração. Hoje, eu creio em Jesus Cristo, eu oro e leio a Bíblia. Por isso, posso dizer que Deus é bom. Eu tenho paz e esperança, eu aprendi a perdoar. Assim, sigo em frente. Desejo a todos a paz e a alegria que eu encontrei.
E a respeito da palavra democracia. Qual peso ela tem em sua vida?
A democracia é igualmente importante para mim, pois ela permitiu que eu tivesse liberdade. Sendo livre eu posso aprender o que quiser e trabalhar onde desejar, posso pensar e sorrir. Todos precisam disso.
Voltando à minha história, em muitas situações eu estive sob um controle rígido, não apenas em virtude do regime político em que vivia, mas, também, pelo Cao Dai, a religião que professava, contextos que limitavam minha possibilidade de agir livremente. Hoje, eu entendo que é maravilhoso ter liberdade em minha alma e em meu coração, ter liberdade tanto no físico quanto no espiritual. Eu realmente valorizo isso.
A próxima palavra é justamente liberdade. Qual é o significado dela em sua trajetória?
Liberdade é muito bom. Ao ler minha autobiografia, o leitor verá o quanto eu a persegui em minha vida. Para mim, a questão mais importante acerca da liberdade foi aprender a perdoar. Quando aprendi a fazer isso, meu coração foi liberto. Nele já não há lugar para o ódio ou ressentimento. Com meu coração livre eu posso fazer o que quiser. Isso é muito importante.
No livro, você fala de maneira bastante fervorosa sobre o amor de Jesus Cristo e o que ele tem feito por você e sua família. De que forma esse amor foi e tem sido crucial para sua restauração?
Falar sobre o amor de Cristo é tão fascinante! Durante minha infância, fui criada seguindo os preceitos do Cao Dai. No fundo do meu coração, eu era bastante devota a essa religião. Eu não conhecia nada que fizesse mais sentido. Em meio ao meu sofrimento, eu perguntava: “Onde está Deus?” Mas não encontrava nenhuma solução no Cao Dai, não havia esperança.Eu orei a muitos deuses, mas nenhum deles me ajudou nem me deu a paz e a alegria que eu desejava.
Finalmente, depois de tornar-me cristã, eu aprendi, por meio da Bíblia, o quanto Jesus sofreu, chegando a morrer na cruz em meu lugar, para pagar pelos meus pecados. Eu soube que ele é Deus e que fez tão sublime sacrifício por mim. Eu me identificava com isso em virtude de meu sofrimento. Meu coração estava cheio de raiva, ódio e amargura. Eu queria saber como me libertar desses sentimentos. Embora eu desejasse isso com todo o meu coração, sem Cristo eu não conseguia fazê-lo.
Como resultado de meu relacionamento com o Salvador, eu comecei a orar e a ler a Bíblia. Minha fé passou a ficar mais forte a cada dia. Percebi que se Jesus disse: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem (Lc 23.34)”, eu poderia seguir esse exemplo.
Dessa forma, eu comecei a orar assim: “Deus, ajuda-me a fazer isso também. Eu quero ser livre da raiva e do ódio que pessoas más me fizeram sentir”. Eu realmente queria isso. Por essa razão, eu me disciplinei para derramar na presença de Deus todo o meu ódio. Assim, passo a passo, Deus me ajudou, seu amor curou meu coração e mudou minha vida.
Estamos vivendo um período conturbado no Brasil em virtude das próximas eleições. A discussão sobre quem será o próximo presidente está cheia de discursos de ódio e intolerância. Muitos parecem estar furiosos, especialmente nas redes sociais. O que você acha disso? É possível falar sobre política sem usar a violência?
Sim, acredito que é possível discutir política sem o uso da violência. Em minha opinião, creio que é importante conversar e promover a paz e o amor. Não acredito no conflito e no uso do poder em busca de interesses egoístas.
O que os leitores podem esperar de seu livro?
Eu sonho que os leitores sejam abençoados ao conhecerem minhas experiências. Eu fui uma pequena garota, vítima de uma tragédia. Não tive como evitar isso. Ao passo em que fui crescendo, porém, aprendi muitas lições que podem inspirá-los.
Meu desejo de superar a dor, a determinação para vencer as dificuldades, a maneira como aprendi a perdoar e a seguir em frente, minha fé, e todas as vitórias que tive na jornada podem edificar os leitores e ajudá-los a terminar cada dia sabendo que podem ter esperança, paz, alegria, amor e perdão. Se todos vivermos dessa forma, poderemos fazer esse mundo um lugar melhor e pacífico.
Uma mensagem final aos leitores, especialmente para aqueles que estão passando por momentos difíceis.
Por favor, querido leitor, não desista! Continue crendo e aprendendo sobre Deus. Ele é maravilhoso e está acima de seus problemas. •
Você também vai gostar de ler!
“A menina da foto”, autobiografia de Kim Phuc Phan Thi, agora em português