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Profissão Teólogo

Entrevista especial com Ziel Machado

Para celebrar o Dia do Teólogo, 30 de novembro, preparamos um conteúdo especial: entrevistamos Ziel Machado, vice-reitor do Seminário Servo de Cristo e pastor na Igreja Metodista Livre – Nikkei, ambas organizações localizadas na cidade de São Paulo.

Ziel estudou História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Teologia pela Faculdade de Teologia Metodista Livre (FTML-SP), pelo Regent College (Canadá), e pela Faculdade Teológica Sul Americana (FTSA-PR), além disso possui formação em Ciência da Religião pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

No bate-papo, Ziel compartilha informações sobre o estudo da Teologia e fala sobre o papel e a área de atuação do teólogo. Com uma abordagem rica e curiosa, elucida os desafios e as dificuldades encontrados no dia a dia de quem se dedica a essa ciência, dá insights para os interessados no ramo e deixa uma mensagem final aos nossos leitores.

Um conteúdo imperdível. Confira!

Mundo Cristão: O que é Teologia?

Ziel Machado: Gosto da definição simples e direta de M. James Sawyer que afirma que “Teologia é aquilo que se pensa ou se diz a respeito de Deus”.

E o teólogo (a)? Quem é?

De uma forma geral, todo ser humano ocupa parte de suas reflexões com as questões relacionadas a Deus.

No entanto, o teólogo (a) profissional é aquele (a) que se ocupa em elaborar o discurso teológico, é alguém que se dedica ao campo de um conhecimento organizado acerca de Deus, e o faz de forma estruturada, tomando em consideração a tradição formalmente reconhecida da reflexão teológica.

Quais disciplinas a Teologia estuda?

Há um conjunto muito amplo de disciplinas estudadas. Além das disciplinas clássicas, com o passar do tempo, novas disciplinas têm sido incorporadas ao currículo.

Começando pelas línguas bíblicas, seguidas pelo vasto conjunto de disciplinas introdutórias, disciplinas relacionadas à interpretação do texto bíblico, outras dedicadas às variadas formas de organizar o conteúdo teológico, como a Teologia Bíblica e a Teologia Sistemática.

Além disso, temos História Eclesiástica, Filosofia, Missiologia, Teologia e Práticas Pastorais, Teologia Espiritual (Espiritualidade), Liturgia, entre outras.

Ao longo dos séculos, outras disciplinas têm produzido interfaces importantes com a Teologia, começando pela Arte, Música, chegando à Arquitetura, Psicologia, Ética, Economia, Ciência Política, Ecologia e Antropologia.

O desenvolvimento histórico tem provocado o surgimento de novos campos de estudo e interfaces, tais como: Teologia Pública, Teologia Negra, a reflexão preocupada com as questões de gênero, os estudos feministas, entre outros.

Há algum pré-requisito para tornar-se um teólogo? O que um interessado deve ter em mente ao empreender esse estudo?

Quando entrevisto os candidatos ao estudo da Teologia, fico impressionado com a grande variedade de motivações apresentadas.

Hoje, temos muitas opções de formação teológica formal.  De modo geral, eu diria que os pré-requisitos seriam a paciência para percorrer uma longa trajetória de formação, o gosto pela leitura e o compromisso de desenvolver um estilo de vida que permita o estudo sério.

Digo isso porque nossa vida urbana, agitada e cheia de distrações não é uma parceira ideal para quem quer se dedicar a esse campo do conhecimento. O compromisso com o estudo teológico vai demandar uma revisão de prioridades, um novo estilo de vida.

De forma particular, eu faço parte de uma tradição evangélica confessional que tem outros aspectos considerados fundamentais para a decisão de estudar Teologia.

Para alguém que pertença a uma comunidade de fé, para um membro de uma igreja cristã que considera que a iniciativa de Deus de se revelar a nós demanda uma resposta de nossa parte, em conformidade com aquilo que nos foi revelado (sobre a pessoa de Deus, sua vontade, seu propósito, seu modo de agir na história, sobre nossa situação como seres criados por Deus), se espera um profundo amor a Deus (Pai, Filho e Espírito Santo), à sua Palavra e à sua Igreja.

O estudo teológico, nesse tipo de relação, é uma expressão de adoração ao Senhor Deus, o que estabelece um tipo de relação muito especial entre quem estuda e aquilo a que se dedica a estudar.

Costumo dizer aos meus alunos que devemos fazer teologia de joelhos, conscientes diante de quem estamos. Não nos cabe outra forma de nos aproximar do Senhor e de sua Palavra.

Toda a reflexão é um ato de adoração (não apenas transpiração). O compromisso obediente é um ato de amor reverente. Nesse ambiente confessional, o conhecimento está vinculado à obediência, não se limita à informação, se espera uma transformação (pessoal e comunitária), uma vida de santidade (pessoal e social), onde nenhuma dimensão da vida humana pode ficar fora dessa aliança entre o Deus Santo e o povo que ele chamou e formou para si, um povo que compartilha esse caráter santo.

A dimensão comunitária — a vida da fé vivida em comunidade — é de fundamental importância para o processo de formação teológica.

Seja qual for a dinâmica de formação teológica escolhida, ela sempre vai implicar em muita transpiração, em muito trabalho reflexivo. Essa dinâmica relacional do estudante com seu campo de conhecimento e o lugar da comunidade nesse processo de formação afetam, de forma significativa, o resultado de todo o processo.  

Quais são os desafios e dificuldades encontrados ao produzir/estudar Teologia?

Pensando na realidade brasileira, eu diria que hoje temos muito mais recursos e possibilidades para esse estudo. De todas as possíveis dificuldades e desafios, gostaria de ressaltar um ponto em especial, com o qual tenho me ocupado nos últimos tempos.

Considero preocupante o fato de que o crescimento numérico da igreja não se expresse da mesma forma e intensidade no valor que as igrejas, de modo geral, dão à formação teológica formal. Estamos caminhando para uma situação na qual podemos nos ver despreparados, como igreja, frente aos desafios que nosso contexto nos apresenta.

Eu reconheço que a formação bíblica/ teológica não acontece de forma exclusiva nas escolas dedicadas a essa área do conhecimento, mas uma igreja madura não pode abrir mão de uma formação mais aprofundada, com a qual podemos nos beneficiar do saber produzido pela Igreja ao longo dos milênios.

Nossa obediência missionária demanda um conhecimento profundo do mundo em que vivemos e da mensagem a que somos chamados a anunciar.

Existem aqueles que olham com certo preconceito para o estudo sistemático da Palavra de Deus, alegando que a teologia pode abalar a fé. Em que ponto erram ao adotar essa postura?

Sim, essa forma de pensar é muito comum. Eu diria assim: o oposto de uma Teologia “ruim” não é uma “não Teologia”; o oposto de uma Teologia que “destrói” a fé é uma Teologia que edifica a fé, não o evitar a reflexão teológica.

Não pensar teologicamente é um jeito muito ruim de fazer Teologia. Certa vez, ouvi do rabino Henry Sobel que a função da exposição bíblica é confortar o abatido e abater o confortado.

Eu gosto muito dessa definição. A leitura bíblica deve nos abalar mesmo, deve nos levar a uma obediência mais radical ao Senhor. Não podemos confundir nossa compreensão com a revelação bíblica.

Pode ser que o estudo mais profundo da Escritura nos ajude a perceber uma compreensão inadequada da revelação bíblica. Domingo após domingo, passamos por esse exercício de verificar nossas compreensões do texto por meio do ensino aprofundado da Escritura.

Deixar de pensar teologicamente por causa de possíveis riscos nunca é uma boa opção. O que nos move é o amor ao Senhor, o desejo e o compromisso de sermos fiéis a ele, no contexto de sua Igreja.

A firme convicção de que Deus falou e fala ao seu povo deve nos fazer empenhar todo o esforço para compreender sua vontade revelada a nós. O medo não deve ser um critério para nossa ação (ou não ação). Aliás, uma advertência bíblica muito enfática é “não tenha medo!”

Quais são as áreas de atuação do teólogo?

Isso tem mudado muito. Dependendo do lugar que os estudos teológicos ocupam na sociedade de determinado país, as possibilidades são muitas.

Eu tive um amigo (hoje falecido) que, como teólogo, era responsável pela avaliação ética de projetos científicos desenvolvidos por uma universidade da Califórnia (USA).

No Brasil, o leque tem se ampliado: pastorado, ensino teológico, capelanias (hospitalar, militar), ONGs (trabalho social), editoras, pesquisa, aconselhamento, ministérios especializados, assessoria ética para membros do parlamento.

Qual conselho daria para quem deseja seguir essa formação/profissão?

Procure se informar com alguém que esteja nesse ramo do conhecimento; visite algumas escolas, assista a algumas aulas e, sobretudo, investigue o seu próprio coração, para saber qual é a real motivação que o move para se dedicar ao estudo da Teologia.

Uma mensagem final, especialmente aos teólogos e às teólogas que celebram o dia dedicado a eles.

Parabenizo os teólogos e as teólogas pelo seu dia. Deixo com vocês duas frases de Dwight L. Moody e uma advertência do apóstolo Paulo a Timóteo:

 “A pregação de que este mundo mais precisa são os sermões em sapatos que estão andando com Jesus Cristo.”

“ As Escrituras foram dadas não para aumentar nosso conhecimento, mas para mudar nossas vidas.”

“Fique atento a seu modo de viver e a seus ensinamentos. Permaneça fiel ao que é certo, e assim salvará a si mesmo e àqueles que o ouvem” (1Tm 4.16, NVT). 

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