Um texto inspirador sobre a importância dos amigos, escrito por Karen Bomilcar, para ler no devocional ou com seu pequeno grupo
A seguir, você lerá um trecho de Corpo como palavra, um livro cristão sobre saúde física, mental, relacional e espiritual. Na obra, Karen Bomilcar apresenta, sob a perspectiva da saúde pública e da teologia, a conexão entre ciência e fé para compreender a criação divina como um todo inseparável: mental, espiritual e físico. Sua abordagem integra os fatores biológicos, psicológicos, espirituais e culturais que condicionam o ser humano, revelando um cuidado especial no tratamento adequado de pessoas em situações de adoecimento.
A partir de uma instigante reflexão sobre a interface entre fé, saúde e comunidade, Karen convida os leitores — e a igreja — a acolher a fragilidade e a promover, sob a ótica da ressurreição, a restauração individual e comunitária, sempre atentos às carências e aos questionamentos da sociedade.
O resultado é um livro fascinante, repleto de informações e princípios de vida para quem deseja compreender a saúde numa perspectiva integral, e implementar ações que visam ao autocuidado e ao acolhimento de quem sofre. Ao final do artigo, saberá mais detalhes sobre a carreira da autora e encontrará os links para compra de Corpo como palavra, nos formatos impresso e digital.
Amadurecimento por meio das amizades
Por Karen Bomilcar em Corpo como palavra
Os encontros públicos de nossas comunidades não são suficientes para nutrir a profundidade das relações que buscamos. A igreja, de maneira geral, é bastante heterogênea e possui características muito específicas, tanto culturais quanto de viabilidade de encontro. Num centro urbano como São Paulo, regido pelo trabalho, as demandas e opções de deslocamento e horários tornam-se sempre desafiadoras. Tenho um amigo que organizou seu pequeno grupo de comunhão à meia-noite das sextas-feiras.
Era o único momento possível para reunir os jovens que ele liderava, pois todos trabalhavam e/ou estudavam em outros horários, mas não queriam deixar de se encontrar. Precisamos de amigos na caminhada, pessoas que andem conosco, que nos ajudem a crescer. Na infinidade de formulários que preenchemos durante a vida, deparamos frequentemente com a frase: “Em caso de urgência, favor ligar para…”. De quem é o contato que você escreve lá? Em outras palavras, a quem recorremos depois que o caldo já entornou?
Quando sentimos que chegamos ao limite, que pessoas nos ajudam a lidar com as consequências que virão? Aliás, de que limite estamos falando? A vida nos apresenta uma dança veloz entre momentos de autonomia e dependência. Estamos cada vez mais anestesiados e desatentos aos sinais que precedem o que consideramos “trágico e urgente”. Cada vez mais independentes, solitários, autossuficientes e distraídos.
Sim, existem coisas que nos atropelam e interpelam e não nos permitem nem tempo de respirar. É o que chamamos de tragédia ou fatalidade. Mas a maioria das questões da vida cotidiana consiste em processos. Passo a passo, caminhamos em determinadas direções. E são muitos os sinais pelo caminho.
Sugiro então que, se não andarmos sozinhos, muito do impacto dessas situações poderá ser amenizado. Porque estaremos juntos, atentos a alguns dos sinais e movimentos de nosso coração, concedendo espaço para transformações e crescimentos, o que torna a jornada mais bonita e mais leve. […]
A amizade espiritual é uma das práticas reconhecidas como um canal da graça de Deus. A perspectiva de um amigo pode ser um recurso de restauração fundamental, uma vez que pode descortinar, em território de amor e confiança, nossa cegueira para as realidades internas que se tornam destrutivas para a maturidade espiritual, realidades como comportamentos, escolhas e relacionamentos. Um amigo espiritual pode nos aproximar de Deus enquanto aponta nossas tendências de desequilíbrio e caminha fielmente conosco em oração para que cresçamos em fé, esperança e amor.
Em suas observações sobre amizade espiritual, o abade medieval Elredo de Rievaulx destaca que um amigo espiritual é como um “guardião do amor”. Sob essa perspectiva, temos um papel fundamental e ativo no encorajamento da preservação e do desenvolvimento do amor de nossos amigos por Cristo e pelo próximo. Tudo isso fundamentado e nutrido por nosso relacionamento com Deus.
Na prática da amizade espiritual, a conversação torna-se vital. Na conversação, praticamos uma escuta e uma fala intencional e cuidadosa, aprendemos mais sobre nossa identidade à luz do olhar amoroso de Deus através dos olhos da pessoa que está ali, à nossa frente, a nos olhar, amar, confrontar e confortar. Encontramos graça e perdão na presença do outro.
Busca livros sobre a importância das amizades?
Clique aqui e conheça nosso catálogo!
O conceito de prestação de contas é fundamental na prática da amizade espiritual, pois incentiva o diálogo e marca a implementação gradual das percepções de transformações e hábitos que são fruto da ação graciosa do Espírito na vida dos seguidores de Cristo. Nessa escuta atenta e constante, respeitamos os limites quando um amigo não consegue tratar de determinadas questões, aprendemos sobre o tempo dos processos de Deus, crescemos em fé e desenvolvemos a liberdade de fazer as perguntas que levarão ao processo conjunto de nomear o que até então não éramos capazes de enxergar sozinhos.
A dinâmica da oração na amizade espiritual estabelece um sentido importante para essa relação ao incluir Deus como o sustentador central: a compreensão fundamental de que não é um relacionamento destinado apenas ao serviço mútuo, mas, em última instância, um meio pelo qual crescemos no amor e na adoração a Deus, mesmo e sobretudo em meio a nossas diferenças e vulnerabilidades.
Faça uma pausa para um exercício de reflexão sobre sua própria jornada e sobre aqueles que você escolheu como companhia nessa caminhada. Quem são essas pessoas? Priorize apenas nas urgências. Acolha em amor os alertas que recebe de seus amigos espirituais, mesmo que isso cause desconforto
e até raiva num primeiro momento. Lembre-se: “A repreensão franca é melhor que o amor escondido. As feridas feitas por um amigo sincero são melhores que os beijos de um inimigo” (Pv 27.4-5).
Podemos escolher o caminho perigoso da omissão ou podemos optar pela ação amorosa: abrir espaço confiável para ouvir a confissão do outro, exortá-lo em amor e comprometer- nos a orar por ele. E, de igual modo, acolher o caminho inverso, ouvindo nossos amigos espirituais e recebendo seu cuidado, cultivando relacionamentos de afeto que nos trarão a possibilidade da sincera alegria compartilhada que experimentamos na vida abundante presenteada por Deus.
Mais uma vez, cabe observar que fazemos isso de forma encarnada, olhando nos olhos, verbalizando palavras de encorajamento e exortação, abraçando, secando lágrimas, ouvindo palavras de perdão. Isto é, testemunhando juntos a ação do Pai, crescendo juntos em fé, esperança e amor. Quando o Corpo de Cristo se exercita nesse sentido, cumpre seu papel e vocação. Os frutos são visíveis e testemunham
da bondade, do amor e da misericórdia de Deus para com os seres humanos. Confirmam que, em uma sociedade cada vez mais egoísta e individualista, o caminho da comunhão, da partilha e do serviço é bíblico, possível e transformador.
Conforme nos lembra Jesus: “Eu lhes disse estas coisas para que fiquem repletos de minha alegria. Sim, sua alegria transbordará! Este é meu mandamento: amem uns aos outros como eu amo vocês. Não existe amor maior do que dar a vida por seus amigos. Vocês serão meus amigos se fizerem o que eu ordeno” (Jo 15.11-14).
Um convite ao diálogo entre a teologia, a psicologia e a medicina!
Para adquirir um exemplar impresso, clique aqui.
Karen Bomilcar é graduada em Psicologia pela Universidade Mackenzie, com especialização em Psicologia Clínica Hospitalar pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP). É mestre em Teologia e Estudos Interdisciplinares pelo Regent College, no Canadá. Integra o Young Leaders Generation (YLGen) e é mobilizadora da rede “Saúde para todas as nações”, do Movimento Lausanne. Atualmente, reside em São Paulo, onde trabalha como psicóloga hospitalar na área de saúde pública e como psicóloga clínica, e leciona nas áreas de Aconselhamento, Espiritualidade Cristã e Saúde no Seminário Teológico Servo de Cristo e no Centro Cristão de Estudos.
Leia também nossa entrevista com a autora: