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Reportagem especial: “Mulheres e meninas na Ciência”

Conversamos com quatro acadêmicas sobre a realidade vivenciada pelas mulheres no âmbito científico e trazemos orientação para quem deseja ingressar na área

Você que é leitor ou leitora do blogue MC e acompanha nossas matérias especiais, como as séries Fé e Ciência, Igreja e engajamento social, Retorno ao básico e as entrevistas com autores, personalidades e especialistas das mais diversas áreas, sabe que estamos atentos para proporcionar a você e à igreja brasileira conteúdo relevante que contribua para a reflexão no tocante aos desafios de nosso tempo.

Em comemoração ao Dia das Mulheres e Meninas na Ciência, 11 de fevereiro, conversamos com quatro acadêmicas sobre a realidade vivenciada pelas mulheres que desejam desbravar o âmbito científico. Na reportagem, Elane Chaveiro Soares, Lígia Passos Maia Obi, Marcia Tsuyama Escote e Sorele Batista Fiaux, mulheres que você logo conhecerá, compartilham experiências e informações que elucidam em que pé está a inserção das mulheres e meninas na produção científica no Brasil.

Ao logo do conteúdo, você encontrará hiperlinks para obras ou postagens que versam sobre fé e ciência. Ao final, partilhamos uma série de dicas aos leitores e leitoras MC que desejam ingressar no meio acadêmico, compiladas a partir dos conselhos de Elane, Lígia, Marcia e Sorele.

Mulheres e meninas na ciência: O que elas dizem?

Elane Chaveiro Soares

“O grande desafio é efetivamente saber o que a mulher da atualidade quer.”
Elane Chaveiro Soares, professora do Departamento de Química da Universidade Federal de Mato Grosso e pesquisadora do Laboratório de Pesquisa e Ensino de Química (LabPEQ/UFMT). É graduada em Química e doutora em Educação pela PUCRS

Para falar de ciência no Brasil, precisamos começar pelas universidades públicas, que ainda são as principais instituições de pesquisa no país.

Sou professora em um curso de Química (Licenciatura e Bacharelado) na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) desde o início dos anos 2000. Tenho notado a inserção maciça de mulheres na graduação desse e de outros cursos no âmbito das ciências. Como orientadora em pós-graduação, percebo que a maioria também é mulher. Tal informação pode ser confirmada pelos quadros de matrículas em todo o Brasil.

No geral, a mulheres estão inseridas nas academias, e isso quer dizer que elas estão adquirindo/desenvolvendo habilidades e competências superiores para lidar com o conhecimento mais profundo e elaborado da ciência. Acredito que a participação feminina ficará cada vez mais latente quando essas profissionais, formadas e especialistas nos diversos temas e campos da ciência, ingressarem no mundo do trabalho relacionado à ciência.

Segundo dados divulgados recentemente, no campo da medicina no Brasil, por exemplo, as mulheres serão maioria em menos de dez anos. Seja para ensinar ou para atuar na pesquisa em ciência, a mulher possui características próprias e especiais. Mas a mulher, com muitas outras inferências, ainda encontra dificuldades para se inserir no trabalho científico. Percebo que há incentivos e diversas políticas que procuram favorecer essa inserção. Mas ainda precisamos melhorar muito em diversos aspectos.

Há muitas visões deformadas sobre o trabalho científico. Visões que são inclusive disseminadas tanto por um ensino precário quanto por uma mídia pouco preparada para a realização de uma adequada divulgação científica. Dado inegavelmente percebido durante a recente pandemia de Covid-19.

O meio científico, tanto o de pesquisa pura quanto o de pesquisa aplicada, impõe dificuldades e desafios diversos, sejam estes financeiros ou estruturais. No Brasil, onde pode-se afirmar que ainda não há cultura positiva para a ciência, experimenta-se um pouco desse mundo nas universidades, ao se ingressar por edital como professor e onde, para além da docência, se exerce a pesquisa e a extensão.

Quando se tem a sorte de estar envolvido em bom projeto de pesquisa que conta com financiamento para a compra de reagentes, materiais e equipamentos, em um espaço adequado, grupo qualificado, bem instrumentalizado e dinâmico, não importa se é mulher ou homem. Os projetos se desenvolvem e muitas pesquisas logram êxito. Mas essa não é a regra. 

Dificuldade inerente ao ser feminino

O fato de ser mulher inserida neste meio científico não se configura como uma dificuldade imposta e, sim, como dificuldade inerente ao ser feminino. A mulher é geralmente mais criteriosa, mais dedicada, reflexiva. Por isso, talvez, mais lenta (será?). Não há força muscular significativa, mas há força de personalidade, de decisão e persuasão. Assim, não há dificuldades para a cientista no quesito gerar boas questões de pesquisa.

Como mulher, biologicamente falando, somos mais propensas a dividir nossos interesses e prioridades entre pessoas (família, filhos e cônjuge) e não, necessariamente, com coisas. Isso quer dizer que essas prioridades se intercalam e podem gerar em algum momento da vida dificuldade ou conflito — pessoal, profissional, acadêmico etc.

Em termos de inclusão e de dedicação ao campo da ciência, os obstáculos para as mulheres têm a ver com a própria constituição das sociedades. O machismo ainda existe de forma mais acentuada em alguns contextos, isso é inegável. Lembro-me de um livro do professor Attico Chassot, cujo título é digno de atenção: A ciência é masculina? É sim senhora! (Editora Unisinos). Na obra, ele analisa a sociedade por suas vertentes e visões de mundo, como a grega, a judaica e a cristã. Todas estas impondo, em algum momento da história, algo relacionado à atuação da mulher, não apenas na ciência, mas em diversos outros campos.

No presente século, a mulher dirige empresas, caminhões, tratores e aviões, vota e pode ser votada. No entanto, a mulher continua longe das profissões de alto risco e não é obrigada a servir no Exército Brasileiro. Caberia perguntar se a mulher deveria ter a mesma carga horária de trabalho que o homem, dada sua condição biológica de poder gerar, amamentar e cuidar dos filhos. Mas, consoante a isso, sua valorização profissional também não estaria em jogo? Essas são, a meu ver, apenas alguns dos desafios que a atuação da mulher impõe.

O grande desafio

Assim, penso que o grande desafio é efetivamente saber o que a mulher da atualidade quer. Se ela quer se dedicar à ciência terá que sucumbir a todas as outras áreas de atuação e assumir o ônus dessa decisão.

Do meu lugar de fala, enquanto professora universitária em um curso de Química, enfatizo que não sou feminista, muito menos especialista em questões de gênero, mas defensora do feminino com toda sua exuberância e gentil delicadeza. E reforçaria até, com toda a boniteza que existe na diferença entre homens e mulheres, constituintes da humanidade.

Não vejo possível uma reluzente ciência feita apenas por mulheres ou apenas por homens. Lentes humanas, masculinas e femininas, são relevantes e complementares para que se tenha uma leitura e uma interpretação mais assertiva sobre os fenômenos naturais e suas transformações possíveis.

“Não vejo possível uma reluzente ciência feita apenas por mulheres ou apenas por homens. Lentes humanas, masculinas e femininas, são relevantes e complementares.”

Elane Chaveiro Soares

Assim, o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência me remete a uma possibilidade de recolocação do gênero como parte integrante da história, sem o qual, por procriação, não estaríamos aqui, no presente século, ponderando sobre tais questões. Neste dia, em especial, as vozes femininas precisam ser ouvidas e seu trabalho científico reconhecido, se for o caso.

Mulheres brilhantes

Acredito que, cada vez mais, a ciência, enquanto instituição histórica e cultural, será povoada por grandes e proeminentes mentes femininas. Cito aqui algumas bem atuais: Chris Done, professora de astrofísica na Universidade de Durham, onde pesquisa sobre buracos negros. Chris graduou-se na St. Andrews, fez seu doutorado em Cambridge e chegou a trabalhar na NASA.

Outra mulher atraída pelos estudos astronômicos é Jennifer Wiseman, atualmente palestrante e escritora. Bacharel em física pelo MIT e Doutora em astronomia pela Universidade de Havard, Jennifer estuda a formação das estrelas na nossa galáxia, utilizando radiotelescópios, telescópios óticos e infravermelhos.

Um terceiro exemplo é o de Rosalind Picard, que se formou em Engenharia Elétrica e em Ciências da Computação pelo Instituto de Tecnologia da Georgia e pelo MIT, incluindo um Doutorado em Ciências. Rosalind trabalha como professora de Artes e Ciências Midiáticas no MIT, lugar em que fundou e dirige o Grupo de Pesquisa em Computação Afetiva, campo criado por ela.

No contexto brasileiro, sou cercada por mulheres brilhantes que desenvolvem pesquisas bastante relevantes. Suélem Aparecida de França Lemes, minha colega de universidade da área de Bioquímica, está investigando o potencial da farinha liofilizada da polpa da bocaiúva como adjuvante na redução do peso corporal no tratamento da obesidade, associada ou não ao Diabetes Mellitus, em usuários atendidos pelo Sistema Único de Saúde no estado de Mato Grosso. 

Muitos outros exemplos que ocorrem perto de mim poderiam ser citados aqui, tanto na pesquisa em linhas específicas, como em Química Analítica, Físico-química, Orgânica, Inorgânica, quanto no âmbito do Ensino de Química. A lista seria imensa, demonstrando que a comunidade científica ganha em muitos aspectos com a inserção da mulher.

Quando entendemos que ciência é um tipo de prática social intelectual, devidamente organizada em torno das tradições científicas, compostas por um conjunto particular de valores epistêmicos e de virtudes intelectuais, voltadas para a produção, transmissão e aplicação de um bem particular, qual seja, o entendimento sobre o mundo natural, não podemos tolher as mulheres de tudo isso. Pelo contrário, as mulheres precisam fazer parte.

A atividade científica, assim entendida, passa a ser realizada como uma investigação sistemática que almeja um maior entendimento dos entes, processos e relações presentes no mundo natural. E essa investigação pode ser feita de forma igualmente eficiente por mulheres da ciência.

Não servir a este ou a aquele interesse

Em minha visão, os avanços precisam abarcar diversos territórios que foram traçados ao longo da História da ciência por todas as pessoas envolvidas em seu desenvolvimento. Como um artefato cultural de relevância em grande escala, a ciência não pode servir a este ou a aquele interesse (pelo menos não deveria!), sejam eles femininos ou masculinos, em detrimento da manutenção, sobrevivência e melhoria da humanidade que a realiza.

“Como um artefato cultural de relevância em grande escala, a ciência não pode servir a este ou a aquele interesse (pelo menos não deveria!), sejam eles femininos ou masculinos, em detrimento da manutenção, sobrevivência e melhoria da humanidade que a realiza.”

Elane Chaveiro Soares

Analiso que, para que as mulheres tenham acesso facilitado ao campo de atuação científica, várias alterações sociais ainda são necessárias. Por tudo o que já experimentei enquanto estudante universitária, profissional da educação superior, pesquisadora, mãe e esposa, acredito que estamos nesse caminho.

Tenho três filhos homens, mas também tenho uma neta que este ano completa 9 anos de idade. Sophia encontrará facilidades para estudar e se dedicar à ciência, caso seja seu interesse. Ela, com certeza, vai dirigir um carro logo que completar a maioridade (ou talvez nem precise disso, considerando os transportes inteligentes) e transitará pelo mundo digitalizado com muito mais facilidade e abertura do que eu tive ou mesmo que sua mãe teve.

Com isso, quero dizer que somos a geração de mulheres que poderá propiciar o avanço desejado para que outras mulheres superem as dificuldades, os obstáculos e mesmo os estigmas relacionados à atuação do gênero no âmbito da ciência. 

No catálogo MC:  ‘Uma teoria de tudo (que importa): uma breve introdução a Einstein e suas ideias surpreendentes sobre Deus”, livro escrito por Alister McGrath.

Lígia Passos Maia Obi

“Precisamos dar mais suporte para meninas e mulheres transitarem no meio acadêmico.”
Lígia Passos Maia Obi é professora da Universidade Federal do ABC (UFABC) e doutora em Química

A participação de mulheres e meninas é crescente, mas precisa ser maior, sobretudo após o nível de doutorado, quando há mais dificuldades na carreira.

Em minha opinião, as mulheres, por serem mais perfeccionistas, são mais críticas com relação a suas competências técnicas. Por isso, tendem a assumir menos riscos. O meio acadêmico requer competência e conhecimento técnico, mas também boa autoimagem, postura confiante, capacidade política nas relações interpessoais e disposição para assumir riscos (habilidades conhecidas como Soft Skills). Sendo a pesquisa o explorar o desconhecido, há incerteza acerca dos resultados, portanto há riscos.

A questão da produtividade

Outro aspecto é que o meio acadêmico muitas vezes exige dedicação bem maior do que 40 horas semanais. Nesse contexto, por terem culturalmente mais responsabilidades na vida pessoal, especialmente como mães, as mulheres não podem fazer horas extras, enquanto os homens têm mais flexibilidade e conseguem produtividade maior — os profissionais são comparados através dela e terão mais ou menos recursos para trabalhar dependendo dela.

Na carreira acadêmica, a possibilidade de participar e avançar na área de pesquisa não está só ligada à qualidade do trabalho em pesquisa, mas também à velocidade, para citar um aspecto. Se a produção científica de uma pessoa não atinge certo número num determinado tempo, essa pessoa não tem autorização para participar de programas de pós-graduação e orientar alunos de mestrado ou doutorado, por exemplo.

Uma data como o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência é importante para mostrar que é uma carreira possível para mulheres e meninas, uma oportunidade para discutir as peculiaridades da trajetória feminina, as dificuldades e estratégias. Realizar essa discussão e dar visibilidade àquelas que estão na carreira científica as fortalece e inspira e motiva as que desejam entrar.

Como em outras áreas, a comunidade ganha com maior diversidade de pontos de vista e vivências, o que traz mais ferramentas para resolver problemas. A reflexão contribui também com o desenvolvimento de políticas que tragam mais justiça à situação das mulheres e meninas na ciência, como a consideração do impacto da licença maternidade e o cuidado de crianças pequenas na comparação entre pesquisadores para concessão de financiamentos de pesquisa.

“Como em outras áreas, a comunidade ganha com maior diversidade de pontos de vista e vivências, o que traz mais ferramentas para resolver problemas.”

Lígia Passos Maia Obi

Precisamos dar mais suporte para meninas e mulheres transitarem no meio acadêmico, especialmente na forma de mentorias, de modo que elas possam entender como o meio funciona e agir considerando as diferenças entre homens e mulheres e as soft skills necessárias nesse contexto, o que vai gerar mais confiança e sucesso.

No blog MC “Fé e ciência: Como trafegar pelos dois campos?”

Marcia Tsuyama Escote

“O protagonismo de mulheres na ciência tem aumento nos últimos anos.”
Marcia Tsuyama Escote, professora associada nos cursos de Engenharia de Materiais e Física da Universidade Federal do ABC (UFABC), bacharel em Física, mestre em Ciências e doutora em Física pelo Instituto de Física da USP.

Acredito que ainda não existe um equilíbrio de gêneros, mas o protagonismo de mulheres na ciência tem aumento nos últimos anos.

Hoje é possível ver mulheres participantes, até presidentes, de associações científicas, nomes reconhecidos mundialmente por suas pesquisas, como a Dra. Débora Menezes, que é a primeira presidente mulher da Sociedade Brasileira de Física; a Dra. Marcia Barbosa, que atua como Diretora da Academia Brasileira de Ciências; e a geneticista Dra. Mayana Zatz, pesquisadora que admiro e que é reconhecida mundialmente. Acredito que, com o passar dos anos, teremos cada vez mais mulheres contribuindo em posições de destaque.

A ciência no Brasil foi por muitos anos realizada por homens, então é natural que a maioria dos pesquisadores seja homens. No entanto, não senti que o fato de ser mulher dificultou minha formação ou minha atuação como pesquisadora. Talvez tenha havido comentários machistas, mas isso não interferiu em minha trajetória acadêmica.

Eu particularmente acho que as contribuições das mulheres são tão importantes quanto as dadas pelos homens. Com a participação das mulheres, há mais mentes pensantes contribuindo para a ciência.

Prioridades

Sendo mulher, a maternidade interferiu bastante em minha carreira, pois, em dado momento, senti a necessidade de ter filhos e tive de escolher entre dar prioridade para as crianças e a profissão. Priorizei as crianças. Agora, retomar a rotina científica está sendo um desafio.

Creio que a cultura de mulheres atuando na ciência está se desenvolvendo. Até pouco tempo, a maioria das pessoas não via a ciência como uma possibilidade de carreira. Uma data como o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência é importante para criarmos a cultura de que mulheres e meninas podem fazer parte do que está sendo desenvolvido em ciência e inovação no Brasil e no mundo.

Vejo que a maior participação de mulheres e meninas na ciência é um movimento lento que vem sendo desenvolvido pela divulgação por meio do jornalismo, dos projetos de extensão de divulgação científica incentivados pelas instituições de ensino e pelo fomento através do Ministério da Educação (MEC). É essencial melhorar muito o ensino público (Fundamental e Médio), para que mais brasileiras e brasileiros possam atuar no desenvolvimento da ciência no Brasil.

“É essencial melhorar muito o ensino público (Fundamental e Médio), para que mais brasileiras e brasileiros possam atuar no desenvolvimento da ciência no Brasil.”

Marcia Tsuyama Escote

Eu sempre quis atuar na área acadêmica e sempre tive o incentivo de minha mãe. No meu caso, só existia um caminho: a universidade pública. Eu parei um ano para estudar e consegui ingressar na Universidade de São Paulo. Depois da graduação, veio o mestrado e o doutorado. Em todas as etapas, dei monitoria em cursinho preparatório, tive bolsas de iniciação científica, mestrado, doutorado e pós-doutorado. Até que finalmente, em 2006, ingressei como professora na Universidade Federal do ABC (UFABC). Não foi um caminho fácil, tive incertezas e não tinha estabilidade financeira, mas a determinação e o sonho em atuar como pesquisadora foi fundamental. 

No catálogo MC: “Inteligência pra quê? Como usar seu cérebro para a glória de Deus”, livro escrito por Pedro Dulci

Sorele Batista Fiaux

“Algo tem de mudar”.
Sorele Batista Fiaux é professora Titular da Universidade Federal Fluminense, engenheira química, mestre e doutora em Engenharia de Processos Químicos e Bioquímicos

As estatísticas recentes mostram que as mulheres ainda estão em desvantagem frente aos homens na ciência, tanto no Brasil quanto no mundo. Por exemplo, mulheres têm menos espaço físico nas instituições para desenvolver suas pesquisas e representam apenas 14% dos editores de revistas científicas no mundo. O número cai para 8% entre os editores-chefes, o que é interessante, porque mesmo aquelas que chegaram a ser editoras de revistas têm obstáculos para se tornarem editoras-chefe. Este quadro, segundo a revista Nature, tem se mantido assim nos últimos 40 anos.

Aqui no Brasil, reportagem no site do CNPq (clique aqui) mostra que somente 33% das mulheres são bolsistas de Produtividade em Pesquisa do CNPq. Essas bolsas são as de mais alto nível do CNPQ e são dadas a cientistas de destaque em suas áreas. Esse percentual se mostra alarmante, considerando que o número de mulheres com bolsas de iniciação científica e as com mestrado e com doutorado é superior ao dos homens. Ou seja, ainda que capacitadas, elas enfrentam obstáculos para obter postos e reconhecimento como líderes.

Não sei se há levantamentos que mostrem a causa desse desnível, mas acredito, como a maioria, que a base é o preconceito contra mulheres em posição de liderança. O preconceito é uma cultura arraigada na mente das pessoas, infelizmente até em muitas mulheres. Temos que reconhecer que a posição das mulheres na sociedade ao longo da história vem sendo modificada. Isso é resultado de um trabalho árduo na conquista de espaço e ainda está longe da igualdade.

“O preconceito é uma cultura arraigada na mente das pessoas, infelizmente até em muitas mulheres.”

Sorele Batista Fiaux

Por exemplo, mulheres passam por licença-maternidade, o que faz a carreira parar. Como a corrida na academia é muito rápida, qualquer parada na vida profissional causa mais distanciamento entre essas mulheres e os homens. Tal fato está sendo levantado no Brasil e em outras partes do mundo, para que a defasagem das mulheres por sua maternidade seja levada em conta quando posições e financiamentos sejam divididos (mais informações aqui).

Uma das conquistas no Brasil é em relação a alguns editais para financiamento de pesquisas começarem a reconhecer o fato e dar algum tipo de bônus para essas mulheres. Na Universidade Federal Fluminense onde trabalho, por exemplo, têm saído editais de bolsas para alunos e de fomento, para pesquisadores, que dão um tipo de bônus para mulheres afastadas por licença maternidade ou para aquelas com filhos até cinco anos.

Com relação às verbas de pesquisa, essas no Brasil têm diminuído. Infelizmente, as pessoas não conseguem enxergar a importância da pesquisa para a melhoria do desenvolvimento humano no país e para a soberania nacional. Em geral, a pesquisa é vista como algo supérfluo que gasta muito dinheiro sem necessidade. Então, juntando esse fato com a cultura, ainda que velada, de que homens são mais adequados para as posições de liderança, sobra menos verbas ainda para as mulheres desenvolverem suas ideias e pesquisas.

Cito como exemplo uma rede de pesquisa que envolve várias equipes, para a qual entrei recentemente. Entrei como participante de uma das equipes e constatei que os líderes das equipes eram todos homens. Perguntei a razão de não haver mulheres entre os líderes e fui ignorada.

Outra situação: acabo de sair de uma reunião ligada à ciência. Dos dez membros do grupo, somente três eram mulheres. Algo tem de mudar, e acho que o Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência pode cooperar para isso. A movimentação das informações e a divulgação do que tem sido feito por mulheres na ciência pode cooperar para mostrar que há lugar na ciência esperando pelas meninas e incentivar a ocupação dele.

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Onde há oportunidades para quem deseja se dedicar à ciência?
  • Nas universidades públicas e em alguma particulares, nos institutos de pesquisa em todas as áreas do conhecimento.
  • Na indústria farmacêutica; de alimentos; de combustíveis; de transporte; das comunicações.
  • Nas questões ambientais, sociopolíticas e humanitárias.
  • Nos programas de iniciação científica para alunos do ensino médio e de graduação.
O que as acadêmicas aconselham?
  • Acessar canais de informação das universidades públicas, para ter conhecimento das oportunidades;
  • Buscar as melhores instituições e se engajar;
  • Conciliar capacidade com empenho, desejo com persistência;
  • Conhecer metodologias de pesquisa e de apuração de referenciais teóricos;
  • Explorar oportunidades de colaboração;
  • Investir na aprendizagem da língua inglesa;
  • Não adiar o início da carreira e participar de atividades de pesquisa o quanto antes;
  • Planejar e investir esforços para estudar em universidades públicas;
  • Se possível, fazer a pós-graduação stricto sensu logo ao final da graduação.
  • Ser confiante.

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