Gustavo Assi, secretário executivo da Associação Brasileira de Cristãos na Ciência – ABC², esclarece o assunto. Veja a sexta parte da entrevista
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Mundo Cristão: De que forma a cosmovisão cristã e bíblica pode enriquecer e complementar a vida acadêmica?
Gustavo Assi: Só tem cosmovisão cristã quem é cristão, quem tem a semente da fé desenvolvida em seu coração. O cristão reconhece que não existe nada neste mundo que não pertença a Cristo. Ele crê que não há nenhum centímetro quadrado sobre o qual Cristo não diga “isso é meu” (citando A. Kuyper). Tudo foi criado intencionalmente, fruto da vontade do Deus Todo-poderoso e Criador de todas as coisas. Se sou um cientista, um profissional da área de tecnologia ou membro da academia, e sou cristão, é óbvio que a minha cosmovisão vai influenciar ou definir tudo aquilo que eu faço, porque ela define a forma como eu vejo o mundo. Só que aí a cosmovisão cristã é enriquecida pelas descobertas que eu faço ou pelas coisas que eu crio através da tecnologia no mundo natural. Para o crente, tudo o que ele faz, o faz diante da face de Deus; tudo é uma expressão de louvor. Não há nada que seja secular, porque nada está fora do senhorio de Cristo, muito menos o empreendimento científico, que é parte do nosso mandato cultural de governar sobre a criação. Exercer esse mandato dá prazer ao homem, especialmente quando descobre verdades genuínas por meio do método científico na esfera natural das coisas. Eu não preciso de nenhuma revelação sobrenatural, nenhum anjo, nenhum sonho, nenhum sopro do Espírito para eu descobrir verdades concretas no mundo natural. Olha que benção! Deus nos deu acesso a essas coisas através do empreendimento humano, a ciência, que o glorifica quando a executamos.
O cientista ateu acessa os mesmos fatos e realiza as mesmas descobertas, mas não consegue dar o último passo, que é glorificar e reconhecer que Deus é o autor de todas as coisas. A fé, assim, enriquece a vida do cientista e lhe dá um senso de responsabilidade muito grande, porque ele não está só descobrindo coisas pela primeira vez, mas tem o dever de passar aquela informação para o resto da humanidade, como agente do mandato cultural que é.
A universidade não confessional, sobretudo no contexto laico do Estado Brasileiro, não tem uma agenda evangelística nem de defesa da fé. Ela é laica. Ela tem a função de gerar conhecimento, cristalizar os conhecimentos adquiridos pela humanidade e passá-los para as novas gerações. Portanto, o cientista cristão não deve manipular a ciência em favor de sua agenda, porque, em primeiro lugar, não é essa verdade científica que vai convencer as pessoas de que Deus existe. Apenas pela pregação o fazemos, não pela ciência. Ele erra se tentar pregar a fé por meio da ciência. Pregar o evangelho é, em essência, anunciar João 3.16 e tudo o que vem junto; não é mostrando que um elétron gira em torno de um núcleo atômico que o cientista cristão vai convencer alguém de que Cristo é o Senhor de sua vida. O cientista trabalha dentro de um contexto em que deve exercer sua profissão como tal, através do bom uso do método científico, da tecnologia e da instrução pedagógica. Ele não está no laboratório para fazer defesa da fé, mas esse papel é exercido no contexto da igreja que atua no mundo.
Temos de estar atentos ao fato de que estar em uma universidade laica não significa dizer estar num contexto antirreligioso. Na liberdade acadêmica que nós deveríamos ter dentro das universidades é fundamental dar ao estudioso a abertura para articular a ciência dentro de sua cosmovisão, inclusive se o cientista for cristão. Eu não posso ser proibido de, ao fazer uma descoberta científica, dizer que para mim aquilo glorifica o meu Deus. Essa é uma conclusão pessoal, é a minha expressão de fé que, dentro de um contexto laico, é plenamente cabível. O risco que nós corremos hoje nas universidades brasileiras é que muitas delas deixaram de ser laicas para ser laicistas, ou seja, para ser antirreligiosas, para impedir que qualquer discussão sobre interação entre fé e ciência seja feita no contexto da universidade. Ora, a universidade deveria ouvir e reunir ideias, debates, temas, propostas e discussões de todas as cosmovisões e não de uma exclusiva, que é a cosmovisão ateísta ou materialista. Isso é laicismo, não é laicidade, o que é um risco muito grande para a liberdade acadêmica.
Gostaria de deixar um encorajamento para aqueles cristãos que se sentem chamados e vocacionados para trabalhar na carreira científica, tecnológica ou acadêmica: façam isso, na certeza de que estão exercendo uma carreira profissional dentro do mandato cultural de Deus, em nada envergonhando o nome do Senhor quando descobrirem verdades genuínas no campo da ciência, verdades que têm origem no mundo natural. Trabalhar assim é um serviço ao Reino, enriquece o conhecimento da humanidade e glorifica a Deus. O cientista cristão é aquele que faz ciência bem-feita, a melhor ciência possível, com os melhores métodos, é aquele que não tem medo das verdades que vai descobrir, porque são verdades que pertencem a Deus. •